10 setembro, 2007

Sei ou não sei? Eis a questão!


(...) O meu professor de estatística dizia que o problema é que nós não fomos educados a conviver com a incerteza. Durante toda nossa educação formal, fomos obrigados à escolher entre o 'certo' e o 'errado'. Não nos ensinaram que as coisas, muitas delas, eram (e sempre serão) 'incertas'. Aprendemos a fazer aproximações, aprendemos a escolher entre o 'certo' e o 'errado'. Mas não aprendemos que entre os dois existe o 'incerto'. Aliás, é muito pior, aprendemos a ignorar o incerto, ou tortura-lo até que se torne 'certo' ou 'errado'. O resultado é desastroso: a grande incapacidade da maioria das pessoas de entender a ciência.

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29 comentários:

João Carlos disse...

Percebem a diferença?... O que eu levei dois artigos prolixos para dizer, o Mauro disse em um, conciso.

Osame Kinouchi disse...

OK, OK, sim, estou de volta, um abraço aos amigos...

Marcelo, vou começar a estudar Estatistica Bayesiana para substituir a Estatistica Frequentista que ensino aos meus alunos do primeiro ano.

Nao sei se essa analogia pode ajudar: teorias cientificas sao como programas que geram outputs (previsoes) a partir de inputs (situação experimental ou observacional).

Assim como programas, nunca podemos ter certeza se ela está livre de bugs, inclusive bugs serios em termos conceituais. Me parece que existe um teorema sobre isso, pelo menos para programas mais complexos (talvez o Daniel conheca isso).

Para detectar os bugs, precisamos fazer testes, mas nunca existe a certeza de que foram eliminados todos os bugs.

E, do mesmo modo que teorias, é possivel criar programas alternativos, muito diferentes, que produzem o mesmo output para os inputs da outra teoria. Assim, podemos nos ver numa situação em que nao sabemos escolher qual o melhor programa ou teoria. Em geral, fica-se com a mais elegante...

Daniel Doro Ferrante disse...

OK (Osame-0Km? ;-),

Eu não acho que concordo com essa visão de que "teorias científicas" são como "programas de computador".

Aliás, meu motivo é forte e eu explico (mas não tô com paciência pra por os devidos links — Google/Wikipedia is your friends!): Essa noção surgiu com um dos famosos (e famigerados) Problemas de Hilbert, cuja solução a gente conhece bem: "Teorema de Gödel" (os 2 da Incompletude) — que também aparece na forma dos trabalhos de Turing (Halting Problem) e de Church (Church-Turing Thesis).

Pois bem, o que esses resultados demonstram, principalmente os teoremas de Gödel, é que é impossível se construir de modo axiomático todas as "verdades" (proposições 'true') da Matemática. Taí a coleção Bourbaki que não me deixa mentir. ;-)

Bom, se isso não é verdade na Matemática (que é um arcaboço bem mais rígido e rigoroso que a Física)... certamente também não é real em Física! Aliás, em Física, nós temos uma saída bem "natural" ('pun intended') para esse imbroglio: Experimentos! São eles que decidem a "verdade maior" em Física, assim como em todas as outras Ciências que se respeitam (as ditas "Ciências Naturais").

Por exemplo, em Relatividade Geral, que é uma única teoria, foi preciso todo um refinamento e ferramentas de fora da teoria (topologia diferencial) para se demonstrar que a "teoria" implicava em singularidades. Em Mecânica Quântica, então, nem se fala: a toda hora nós estamos trazendo novos ingredientes e retirando velhos, reformulando tudo o tempo todo. Note, porém, que independentemente desse dinamismo [natural e intrínseco à Física], mesmo que conseguíssemos atingir uma "teoria final", ainda assim ela não seria uma "receita de toda a Física", devido aos Teoremas de Gödel.

Aliás, essa sua pergunta sobre 'bugs' em programas/códigos, se encaixa exatamente nessa visão: É o "Halting Problem" que demonstra que não é possível se caçar todos os bugs dum programa. :-(

Então, entre "elegância", "beleza" e "resultado experimental"... a gente faz um balanço do melhor que tem em mãos... e, como sempre, "fazemos o que podemos"! ;-)





[]'s!

Osame Kinouchi disse...

Daniel, eu acho que na verdade nos concordamos. Chame os diferentes refinamentos da Relatividade Geral de RG1, RG2, etc... Por exemplo, RG2 seria a RG com uma constante de Einstein (constante cosmologica) para dar conta da Energia Escura. Devemos lembrar tambem que outros especulam que nao existe energia escura, mas deveria-se modificar a RG para dar conta da aceleracao cosmologica.
E existem propostas alternativas a RG que sao atualmente indistinguiveis experimentalmente da mesma (scalar-tensor theories)
http://en.wikipedia.org/wiki/Alternatives_to_general_relativity (eu nao sabia que foram tentadas tantas alternativas assim).
E finalmente, todos sabemos que a RG um dia vai se mostrar como uma aproximação de uma teoria de gravitação quantica.
Ou seja, os experimentos sao em numero finito, as diferentes versoes de uma teoria sao potencialmente infinitas. Experimentos podem rejeitar teorias mas nao podem comprovalas integralmente. Sobra apenas criterios como a navalha de Occan, talvez numa versao Bayesiana sofisticada...

Daniel Doro Ferrante disse...

Oi Osame,

Essas "scalar-tensor theories"... melhor deixar pra lá: Elas nasceram com um propósito e, hoje, já foram devidamente "acomodadas" para um "novo" propósito. :-P

De fato, assim como vc, eu também acredito que o conhecimento seja infinito... o que nos leva a infinitas "teorias"... sem o dedo [verde] experimental, a gente fica sem mira, pois não conhecemos um "Princípio Guia" que diga o porquê das coisas acontecerem como o fazem. Acho que é por isso que eu sempre fui tão fascinado com "Functional Calculus": A idéia de ter nada além de uma Ação e a partir duma equaçãozinha "xulé" dizer que a "energia deve ser minimizada"... e, daí deduzir todo o resto... é EXTREMAMENTE apelativo pra mim! Não tem como não ficar abismado com uma coisa dessas.

Meu único 'senão' é que eu acho que os experimentos também podem ser, a priori, em número infinito... imagine só que vc pode ter um experimento para tentar indicar cada detalhe das teorias "degeneradas" (i.e., que possuem as mesmas predições)... De qualquer forma, eu entendi bem o que vc quis dizer: A gente pode impor quanta degenerescência quiser nas teorias, mas os experimentos sempre "levantam" essas safadas e distinguem o que está acontecendo. (Claro, a menos dos casos aonde as teorias têm as mesmíssimas predições experimentais! :-P)

Mas... ficamos por aqui... acreditem ou não, estou saindo pra ir ver a Seleção Brasileira [de Futebol] jogar contra o México, aqui pertinho de Providence (na verdade, muito mais perto de Providence do que de Boston! ;-).



[]'s!

Mauro Rebelo disse...

Amigos, estou lendo e relendo os comentários de vocês. Por enquanto digo apenas que estou feliz de ter suscitado essa discussão. Um abraço

Anônimo disse...

Quero discutir, não, professor, quero que vc escreva o Tao da Biologia... e que desenvolva, para a adepta integral da incerteza (não seria a voie du milieu du boudhisme?), a questão da escolha. Fiquei desapontadissima com aquele bestseller americano "Blink", que (mal)tratou do assunto.

Mauro Rebelo disse...

É você Aliki?

Acho mais fácil eu escrever o 'Caô' da biologia, que o Tao. ;-)

Ainda que a sua colocação outro dia sobre a importância maior da pergunta do que da resposta tenha me feito continuar pensando, acho que existe um fato inquestionável: Se você não tomar uma decisão, alguém (ou alguma coisa) o fará por você.

Abrir mão desse controle, ou abraçar esse risco, é uma decisão individual de cada um. Para determinar isso, a estatística tem uma ferramenta muito interessante chamada de 'análise de propensão ao risco'. Você oferece à uma pessoa um prêmio associado a uma probabilidade de ganhar esse prêmio, e vê se ela aceita ou rejeita a aposta com o base no risco. Depois você pode variar: muda o prêmio, muda a probabilidade. É interessante ver que algumas pessoas são mais propensas ao risco. Outras são mais conservadoras e apostam apenas quando o prêmio é muuuuuito alto, ou o risco muuuuuuito baixo.

Acho que isso tem a ver com o quanto cada um pode perder, tanto quanto a quanto espera ganhar. Citando o Blink, o museu deveria ter sido um pouco mais conservador e investigado mais a suposta estátua grega antes de gastar USD10.000.000,00 numa fraude. Se fossem apenas USD10... eles poderiam se dar mais ao luxo de se enganar.

Não concorda?! Essa análise de propensão mostra outra coisa importantíssima. Não há coerência (de acordo com a conceituação estatística) no comportamento das pessoas com relação ao risco! Isso porque não há consenso entre diferentes pessoas sobre o que é melhor ou pior. (Apenas com relação a dinheiro encontra-se consenso e coerência todo mundo concorda que ganhar $10 é melhor que $1. E que $100 é melhor que $10).

Você pode se divertir construindo a sua curvas para diferentes prêmios e probabilidades e ver se você, budista e adepta da incerteza, no final das contas é propensa ou não ao risco!

Eu sou mais avesso ao prejuízo. A perspectiva de perda me segura mais que a improbabilidade de ganho. Mas esse sou eu!

João Carlos disse...

Mauro:
(Pegando um bonde andando e correndo o risco de cair...)

(Apenas com relação a dinheiro encontra-se consenso e coerência todo mundo concorda que ganhar $10 é melhor que $1. E que $100 é melhor que $10).

Eu acrescento: e nem mesmo aí se encontra coerência. Muitos preferem $1 agora a $10 futuros. Questão de maturidade emocional...

Osame Kinouchi disse...

Joao, na verdade acho que os caras de analise de risco incluem esse fator, chamado desconto temporal ou coisa que o valha. Afinal, eu prefiro ganhar R$1.000 agora do que R$1.000.000 em 2050, porque nao sei se estrei vivo até lá...
Acho que os bancos tambem fazem isso quando te oferecem um desconto caso voce quite toda sua divida com emprestimos hoje...
Desculpem ter fugido do assunto...

Silvia Cléa disse...

Oi, Mauro e João!

Falando em quedas e emoções...
Eu já ficaria entre os que questionaria os $1, $10 e $100...afinal, o que eu vou ter que dar em troca????
Parece, mas não é tão banal assim!

João Carlos disse...

Aproveitando as últimas e voltando ao tema original:

De tudo o que foi dito, fica claro que é instintivo preferir uma "certeza", por mais infundada que seja, do que ter que lidar com as incertezas da natureza e do universo.

Talvez por isso mesmo, seja tão desconfortável para o "grande público" se inteirar dos variados graus de incerteza, inerentes à pesquisa científica.

(Em "off" para OK: sabe que os bancos estão cobrando uma taxa sobre o adiantamento da quitação dos empréstimos atualmente?...)

Daniel Doro Ferrante disse...

@ João,

Ah... as maravilhas das "certezas"... taí uma coisa chamada "camada de cultura da sociedade" (aka "estereótipo" ou "arquétipo", dependendo do cenário em que apareça) que não me deixa mentir: Quando o "povo" não sabe o que fazer... eles ficam no estereótipo! Ou seja, vão até a famigerada "camada de cultura da sociedade" e pegam suas respostas: Ah, devo trabalhar com isso, ganhar tais coisas, casar de tal maneira, etc, etc, etc. Tudo lá, mastigadinho.

Mas, quem é que vai buscar essas respostas?! Qual é o perfil dessas pessoas?!!! Adivinha só... ;-)

PENSAR, como eu costumo dizer, não é um "commodity"... pelo que se anda vendo "por aí afora", pensar não é algo que "valha à pena".

Não sei se essa é uma característica "animal", "evolucionista", nossa: instintos são mais "aguçados" do que "raciocínios". :-(

Mas, veja alguns exemplos interessantes: Pink Floyd, Bob Dylan, Talking Heads, ... , todos têm alguma forma de "mensagem"... todos "pensaram" de alguma forma ou de outra (que a gente pode até discordar, mas essa é outra questão). E, no final das contas, todos eles foram extremamente "bem sucedidos", i.e., colocaram suas "linhas de raciocínio" para o mundo. E olha que eu nem falei do Ultraje à Rigor, do Gabriel o Pensador... nem dos Mamonas Assassinas! :-)

O que eu quero dizer é que "pensar" é raro, muito mais raro do que se quer acreditar. "Certezas" e "dúvidas" são LUXOS que POUCOS conseguem compreender ou assimilar... e, como diz o cancioneiro popular: "Na dúvida, truco!" ;-) Ou seja, é preferível ser ir "pras cabeças" com uma certeza falsa, do que ponderar uma dúvida verdadeira. Vai entender...

Uma coisa, pra mim, extremamente interessante nisso tudo... foi que eu SEMPRE acreditei que cientistas fossem amantes das "dúvidas", dos "questionamentos"... quando eu descobri que a verdade é bem diferente disso... confesso que fiquei chocado. Coitado do Freeman Dyson, até escreveu um livro, "The Scientist as a Rebel"! Parece até que ele não conhece o "stablishment"... :-(

Acima disso, eu acho que dá pra se especular ainda mais: Nós, seres humanos; parece que agimos sempre no contexto do "aqui-e-agora", i.e., me parece que sempre agimos 'localmente'. E, claro... temos uma dificuldade ENORME em entender ações "globais", ações de "longo prazo". E, nesse sentido, pra mim é claro o porquê de "pensar" não ser algo tão "valioso" assim: no dia-a-dia, no 'local', nossos instintos são extremamente mais afiados que nosso raciocínio! Aliás, qualquer um que já fez ou experienciou a ciência mais de perto sabe bem disso: a gente só erra... e, de vez em nunca, um desses erros desabrocha em algo positivo! Então, é claro que "raciocinar" não é algo muito "útil" para a sobrevivência da espécie: Se seus instintos estiverem funcionando afiados... tá tudo certo. Estão aí os tubarões e os crocodilos que não me deixam mentir: Milhares de anos do mesmo "projeto" funcionando na boa! ;-)

Porém... quando nós começamos a interagir e formar "comunidades", sociedades, grupos de indivíduos... aí a coisa TODA muda de figura COMPLETAMENTE!!! Aí é mais-do-que-necessário que nós tenhamos o longo prazo em mente... não para a sobrevivência do indivíduo, mas sim para a sobrevivência do GRUPO! E isso parece que a Mãe Natureza ainda não conseguiu forjar nos nossos genes... longo prazo, raciocínio, não faz parte do nosso conjunto de ferramentas afiadas. :-( E, pior que isso, as pessoas continuam achando que isso é algo desnecessário.

Mas, com sorte, é só culpa da nossa "moderna" existência... comparado com muitas das outras espécies, nós, humanos, ainda somos uma espécie relativamente recente... então, vai ver que ainda precisamos de algum tempo pra incluir esses "detalhes" nos nossos genes... afinal de contas, elefantes, cisnes, golfinhos... se eles parecem ter esse tipo de "instinto de longo prazo [para a sobrevivência do grupo]", por que é que nós não iríamos desenvolver um?!!! ;-)

Eu já mencionei isso aqui no Roda uma vez... mas, falo de novo: Em matemática existe uma "construção" bastante inressante: Co-homologia. A grosso modo, o que essa safada faz é inferir propriedades 'globais' a partir de resultados 'locais'. Oras, se até na matemática se consegue ter algo assim... por que é que nós não conseguimos agir assim no dia-a-dia: Pô, seu eu fizer "A", "B" e "C", então "D", "E" e "F" vão acontecer! ;-)

Mas, chega de viagem... tá na hora de jantar! :-)


[]'s!

João Carlos disse...

@ Daniel:

Pinçado de seu comentário: «Mas, com sorte, é só culpa da nossa "moderna" existência... comparado com muitas das outras espécies, nós, humanos, ainda somos uma espécie relativamente recente... então, vai ver que ainda precisamos de algum tempo pra incluir esses "detalhes" nos nossos genes... afinal de contas, elefantes, cisnes, golfinhos... se eles parecem ter esse tipo de "instinto de longo prazo [para a sobrevivência do grupo]", por que é que nós não iríamos desenvolver um?!!! ;-)»

O problema é que temos esse instinto. Ele costuma aflorar nas situações de crise, onde aparecem os "homens-comuns-transformados-em-heróis". Resta saber o que faz com que este mesmo homem-básico se torne um anti-social. Eu tenho um palpite (cadê o Rogério quando a gente precisa dele?) de que a capacidade de modificar o ambiente tenha "deformado" este instinto de sobrevivência do indivíduo, colocando-o acima da sobrevivência da espécie.

Se você perguntar a qualquer um, ele vai responder que prefere viver em um lugar tranqüilo, onde as pessoas se tratam de maneira afável e todos prosperam. E vai dizer isso para você enquanto despeja o lixo no terreno baldio da esquina e toca fogo no monturo... É aquele velho negócio: "chi vó, non pó, etc..."

Talvez a resposta seja meio cruel: como a Lúcia constatou, já tem gente demais no mundo. Alguma coisa (bem feia, por falar nisso) vai acontecer. E, caso a espécie sobreviva (boas chances...), comece a "se tocar" dos reais valores. E troque suas "certezas" pré-moldadas pela busca do "incerto, porém correto".

E deixe eu parar por aqui, antes que eu enverede por caminhos discutíveis...

Silvia Cléa disse...

Oi João!

>>>cadê o Rogério quando a gente precisa dele?

Deve estar dando vazão aos seus instintos ou quiçá esteja somente tentando sobreviver neste ambiente tão complexo chamado internet que pode lhe parecer "muito" complexo...

>>>Se você perguntar a qualquer um, ele vai responder que prefere viver em um lugar tranqüilo, onde as pessoas se tratam de maneira afável e todos prosperam.

O problema reside (para esta 'qualquer uma aqui') em sua definição de tranqüilo...conheço dezenas (para não ser tão enfática) de pessoas que tremeriam só de imaginar a hipótese de um lugar assim. Cabotinagem? Duvido. Sinceridade e idiossincrasias que devemos respeitar em um mundo de pluralidades como este que se nos apresenta.
Ressalte-se, não é necessário que essas pessoas a que me refiro sejam, necessariamente, portadoras de distúrbio social qualquer ou não respeitem o planeta.
Apesar de gostar de cortesia, eu mesma chego a questionar o quanto apreciaria a tal tranqüilidade que vc sugere...
Aliás, João, para que uma sociedade seja considerada saudável é necessário que ela tenha em seu bojo as mais diferentes mentes, inclusive o anti-ecológico e o psicopata (vou tentar achar o trabalho sobre isso, é bem interessante!)

João Carlos disse...

@ Sílvia:

Apesar de gostar de cortesia, eu mesma chego a questionar o quanto apreciaria a tal tranqüilidade que vc sugere...

Bom... Eu falei de tranqüilidade, não de marasmo.

Aliás, João, para que uma sociedade seja considerada saudável é necessário que ela tenha em seu bojo as mais diferentes mentes, inclusive o anti-ecológico e o psicopata(...)

Hmmm...! É uma hipótese tentadora... Algo assim como "para criar os anticorpos necessários"... Me faz lembrar uma discussão dos tempos de juventude: "qual seria a punição a um criminoso em uma sociedade 'perfeita'?" A conclusão a que chegamos, então, foi que uma sociedade 'perfeita' teria que assimilar o comportamento 'anti-social' como algo natural e seria 'auto-imune', não necessitando de 'punições'... Mas eu desconfio que esta é mais uma resposta "simples, elegante e errada"...

De qualquer forma, uma "mesmice" de formigueiro é um "beco-sem-saída" evolucionário. Porém, est modus in rebus... Os "marginais" são necessários para evitar a estagnação, mas não se pode aceitar, igualmente, que sejam a "moda" de uma sociedade.

Citando Umberto Eco (pela boca de seu presonagem, Casaubom, em "O Pêndulo de Foucault"): "Todos nós concordávamos em que a anarquia era a única forma de organização social aceitável... mas sempre teria que haver alguém que cuidasse que os trens saíssem nos horários".

Silvia Cléa disse...

OI, João!

>>>A conclusão a que chegamos, então, foi que uma sociedade 'perfeita' teria que assimilar o comportamento 'anti-social' como algo natural e seria 'auto-imune', não necessitando de 'punições'...

OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOps!
Bem, não vamos nos desviar tanto assim do assunto do moçoilo, apesar de o papo estar ótimo...mas de onde vc tirou a idéia que eu pensei/falei que não precisaria de uma punição!?

Mauro Rebelo disse...

Finalmente vejo o João aceitando um pouco de crueldade do mundo. Mas tenho medo de perguntar quais são os 'reais valores'. Pena que o Daniel não participou da discussão da gente sobre o 'modelo biológico' x 'modelo antropológico' no outro texto. Na verdade Sílvia, talvez não seja só a sociedade que necessite de todas as mentes para ser equilibrada. Talvez nós todos necessitemos do psicopata dentro da gente de vez em quando (tanto quanto da 'criança').

João Carlos disse...

Oi, Sílvia!

Eu não atribuí esta conclusão a você, nem inferi isso de suas palavras. Isso foi o resultado de uma longa discussão de rapazes e moçoilas que pretendiam derrubar a ditadura, afogando-a em tulipas de chopp, após assistir um filme de Bergman, Felini ou Kazantzakis no cinema Paissandú...

Na época (dos "suvacos ilustrados") se ia de "Das Kapital" (sim, eu li todos os 37 volumes da Edição da Presse Universitaire... comprados com meu salário de 2º Tenente), ao misticismo de Powells e Bergier, no "Despertar dos Mágicos".

João Carlos disse...

@ Mauro:

Você está cometendo o erro de me considerar - por ser místico - um conformista com a idéia de um Deus bonzinho e que escuta suas orações.

Pode perguntar sobre os "reais valores": ética, respeito às diversidades, aceitação da inexistência de uma "verdade absoluta" que seja tão simples que possamos compreendê-la, e que toda sociedade tem que ter como lema "mulheres e crianças primeiro". A busca pelo conhecimento empírico é um requisito indispensável para tais "valores".

Pode parecer que um crédulo macumbeiro seja incapaz de aceitar tais coisas, mas nós, macumbeiros, somos bem mais pragmáticos do que se divulga.

Silvia Cléa disse...

Oi, João!

Pardon...;o)))
Mas não foi isso que pareceu, então foi a leitura que me foi capaz...
Dando continuidade, o haver não quer dizer flanar impunimente. Toda existência não é vã!

Mauro

As vivências e experiências são ricas sim, mas lembre-se de duas leis universais: a toda ação há uma reação; e, vc é responsável pelas escolhas que faz!
Tendo bem claras essas duas, o resto é consigo...
Mais uma dica (se é que me permite), a tal personalidade anti-social (vulgo psicopatia) tem graduações...e se formos analisar, traços dela podem estar presentes em alguns comportamentos de muitas pessoas com quem convivemos, mas não é algo que "decidimos" ter ou não (ou seja, não é uma característica adquirida).

Anônimo disse...

Desculpa Mauro, era e sou eu sim, aliki, adorando a conversa afiada...

Anônimo disse...

Hummm... Fiquei um pouco incerta acerca do que escrever... Mas vamos lá, há alguns pontos. Falando em exatas, me ocorreu um exemplo maravilhoso do Zar, o autor de um ótimo livro de bioestatística que me perseguiu (o livro, não o autor) durante os anos de pós. Há 4 lugares onde pardais fazem ninhos: árvores, arbustos, troncos e pedras. Em uma floresta, há 100 pardais. Dentre eles, 90 fizeram ninhos em árvores, 4 em arbustos, 3 em troncos, 3 em pedras. Qual é a chance de você olhar para cima de uma árvore e encontrar um ninho de pardal? Em outra floresta, há 100 pardais. Dentre eles, 25 fizeram ninhos em árvores, 25 em arbustos, 25 em troncos, 25 em pedras. Qual é a chance de você olhar para cima de uma árvore e encontrar um ninho de pardal? Assim ele explicou o conceito de diversidade. Nesse caso, diversidade de lugares de ninhos de pardais. E o mais lindo foi dizer que o índice de diversidade deveria ser chamado de índice de incerteza. A segunda floresta é um ambiente mais incerto, menos previsível, do ponto de vista do local de ninhos. Quanto maior a incerteza, maior a diversidade. Olha aí que frase linda, pra gente transpor para outros domínios! Não vou nem puxar a brasa para a sardinha de minha preferência...

E não poderia deixar de citar a máxima que aprendi com meu oráculo, Sonia Rodrigues: “Cris, na vida, você prefere estar certa ou ser feliz?”. A incerteza, estou convencida, está fortemente correlacionada (para usar o termo estatístico correto) com a felicidade. Ou por outra, a opção pela incerteza é um pacto com a felicidade. A importância de escolher! Matéria importante na escola, concordo novamente com o Maurinho. Enquanto isso não acontece, eu fico por aqui me esforçando para ensinar ao homem da minha vida a beleza e a essencialidade da escolha por ser feliz. Ainda bem que ele tem muito tempo pela frente pra exercitar a lição!

Rogério Silva disse...

João

Fico feliz em encontrar um companheiro de birita no Bar Oklahoma depois dos filmes dos diretores que vc citou, mais pais Pzolini, Godard, Varda e outros.

E pensar que naquela época descobríamos que acabar com a hegemonia dos EUA era só bombardear o pentágono.

Desculpem, mas é só um pouco de saudosismo...

abs rogerio

Mauro Rebelo disse...

"Porque nós cientistas queremos ter sempre razão?" Essa pergunta, feita por um amigo que é um grande cientista, apesar do contexto diferente (leiam no VQEB) me remeteu a esse texto e a discussão do mês no roda. Nós, cientistas, também fomos contaminados pela educação da dualidade, do certo e do errado. Também queremos sempre ter certeza de tudo. Também queremos ter sempre razão. O meu texto discute muito a culpa dos outros, mas não a do próprio cientista, na comunicação da incerteza. Apesar de me policiar, vejo que muitos colegas são realmente frustrados pela incerteza e procuram a "explicação plausível", que sempre pode ser encontrada a posterióri, mas que nem sempre corresponde a realidade incerta. E, por vaidade, cometemos bem mais que um pecado capital

Kynismós! disse...

Cientistas como Bohr, Fermi, Gamow e Feynman (só para citar alguns) padeciam desse mal?

Mauro Rebelo disse...

Kynismos, tem um livrinho chamado "Penso, logo, me engano" onde um autor francês conta os grandes enganos da ciência. Uns eram autênticos, outros, eram claros resultados de uma tentativa meio infame de tentar corroborar suas teorias apesar dos burcaos que elas apresentavam. Einstein está na lista, mas Newton... encabeça ela!

Carioca disse...

Tô a chegar meio tarde nesta conversa. E não sou muito assíduo a comentar, mas não resisti a comentar o último comentário.

E vou mudar completamente o fio da meada...

Não posso concordar que as companhias de seguros ganhem "rios de dinheiro" com a estatística.

Explico que trabalho no ramo e portanto sou parcial. Contudo, as margens são baixas em alguns tipos de seguros. E há muito poucas seguradoras que usam mesmo a sério a tal técnica de "análise de risco".

João Carlos disse...

@ Marcus:

E há muito poucas seguradoras que usam mesmo a sério a tal técnica de "análise de risco".

... só as que ganham rios de dinheiro... :)